sábado, 30 de março de 2013

MISERANDO ATQUE ELIGENDO


Miserável mas eleito

Eu não sou católico.
Eu não sou cristão.
Eu não sou filiado, nem adepto, de nenhum dogma ou instituição religiosa.
Fui criado e tenho vivido, em países e sociedades de inspiração católica. Mas venho aqui falar como observador e cidadão do mundo.

Francisco.
Um nome apenas e o mundo estremeceu. Não foi somente a Igreja que estremeceu, mas todo o mundo, nomeadamente o diplomático e politico.

Não, eleição papal não é um assunto do Vaticano apenas. Desatentos e ignaros os que assim pensam. A Igreja Católica é um pilar da civilização ocidental; actualmente a civilização global. Não tem como ficar indiferente perante a renúncia dum papa, assim como a eleição doutro. O Vaticano é um estado, uma nação, que embora pequeno em tamanho, tem um papel significativo na estratégia politica e diplomática internacional. A influência do Vaticano vai muito além da Praça de São Pedro em Roma.

Assumo desde já que nunca simpatizei com o anterior papa, o alemão. Pelo contrário, antipatizava com o senhor e até evitava olhar imagens dele, pois me causavam temor. Daí que quando ele renunciou, colhi a notícia com agrado.

Ficou-se então naquele hiato de saber que rumo a Igreja iria tomar, depois dum dirigente tão pouco renovador.

O mundo se entusiasmou em palpites. Eu remeti-me ao silêncio, como um predador de tocaia à beira do charco. Depois de ver a Igreja se fechar cada vez mais numa dogmatização retrógrada e contrária às expectativas e necessidades duma sociedade cada vez mais ansiosa de abertura e liberdade (mais humana, enfim), só poderia mesmo esperar para ver. Palpites nenhuns. Só esperanças, embora que muito débeis.

E depois daquele habitual carnaval dos media, lá saiu o fumo branco da chaminé da Capela Sistina. Espanto meu! Muito cedo, para uma eleição organizada às pressas.

Um nome foi anunciado: Francisco. A primeira vez que um papa se quis associar a esse indigente; única figura que merece a minha admiração e respeito em toda a história da Igreja e da cristandade (tendo que o Cristo nunca se afirmou como cristão).

Os comentadores dos órgãos de informação logo se apressaram a dar os tópicos de posicionamentos do novo papa, sobre vários itens da actualidade, enquanto bispo argentino. Alguns não muito abonatórios, para a conquista da minha simpatia. Mas o sorriso aberto, daquele homem de óculos, que subiu ao balcão acenando com bonomia para a multidão, saudando todos com familiaridade e até improvisando um gracejo sobre a sua nomeação, me merecia o benefício da dúvida.

E assim me tenho mantido atento e tenho constatado com aprovação que este homem parece disposto a fazer a diferença e apontar novos rumos à Igreja. Desde a escolha da prata (metal ligado à sua terra de origem; Argentina) como material para a confecção do seu anel papal, à obstinação em quebrar protocolos e normas de procedimento, tais como a simples recusa de abandonar os seus sapatos comuns, para usar os exclusivos sapatos vermelhos papais e muitos outros procedimentos faustosos, com pouca leitura mística e quase somente intimidatórios de poder e supremacia.

Antes de esperar mudanças nas posições seculares da Igreja, terão de haver reformas na própria instituição, tanto na sua estrutura rigidamente burocratizada e hierarquizada, como na sua doutrina e dogmas. Mais que qualquer outra religião da cristandade, a Igreja Católica tem o poder de apontar as modas morais para um novo mundo, se souber se contemporizar e escutar os apelos das gentes acima dos ditames do puritanismo febril e inumano.

Ajudemos este papa Francisco a revolucionar a Igreja e fazer o dogma cristão mais cristão e menos paulista.

Dedicatória: dedico este texto ao meu jovem amigo Tony Rhafer Falcão e a todos os jovens católicos que se empenham pela construção dum novo mundo, com mais respeito pela dignidade do ser humano.

Nota: a tradução do lema papal, desde o latim, é livre e de minha autoria.