quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

SEXTA-FEIRA

Depois de ter vencido todos os atrozes rituais, plenos de crises de ansiedade e subterfúgios de procrastinação, lá consegui sair de casa para ir ao aeroporto, onde compraria a passagem para o meu futuro. 
Havia sol e a temperatura era amena, dir-se-ia um dia primaveril, não fosse estarmos em véspera de carnaval.

Chegado na paragem do autocarro (Br; "ponto de ónibus"), que me levaria até à estação onde apanharia o comboio (Br; "trem") para Lisboa, fiquei esperando, juntamente com um grupo de adolescentes. Uma jovem vestia um equipamento de futebol, entretendo-se com a bola enquanto tagarelava com os amigos e amigas que esperavam o transporte. A conversa era sobre colegas que eram gays ou não, mas sem nenhum tom recriminatório ou de troça; apenas a busca de identificação entre iguais. 

O trânsito automóvel passava num sentido e noutro, enquanto na paragem todos esperávamos o autocarro. 
E do nada aproxima-se uma adolescente, abraçando contra o peito uns compêndios escolares, dirigindo-se à menina futebolista. As duas se abraçam com ternura. A menina da bola segura a cabeça da outra entre as mãos, afagando-lhe o cabelo e, olhando-a nos olhos diz com doçura: "Oh, meu amor!" Beijaram-se e depois voltaram todos a conversar, enquanto a menina da bola retomou a troca de passes com outros colegas que estavam por perto.

Como era sexta-feira de carnaval, alguns dos rapazes estavam com roupas femininas e usavam perucas longas, que balouçavam estouvadamente enquanto eles corriam atrás da bola. Por vezes a menina futebolista vinha até à paragem e abraçava a sua namorada, dando-lhe um beijo rápido, para logo correr de volta ao jogo.

A espera começava a ficar longa, pois eu aguardava em pé. Então na esquina da rua surgiu a frente de... "O autocarro, amor!" gritou a jovem que esperava na paragem. A futebolista acorreu prontamente e as duas se abraçaram com a mesma ternura e se despediram com um beijo. Nova carícia nos cabelos da menina dos livros, que se voltou e entrou no autocarro, com os olhos brilhando de felicidade. Eu entrei também.
Lá fora a outra acenava e soprava beijos com a mão, até os outros a chamarem de volta ao jogo.

Percebi que nem todos os nosso jovens de hoje são preconceituosos.

sábado, 14 de fevereiro de 2009

AUSENTE

Tem dias... tem momentos... tem períodos...

Por vezes sinto-me como se não soubesse de mim; quem sou, o que penso, o que sinto, o que quero.

O mundo torna-se um lugar estranho, vazio, sem sentido. 
Olho em volta e tudo é distante; mesmo aqueles que me rodeiam. Como se eu tivesse acabado de chegar de um outro mundo, longínquo e impossível de existir, sem nunca ter estado aqui, sem nunca ter sido quem sou.

Olho para mim como se olhasse alguém que encontrei pela primeira vez e de quem nada sei. 

E é um vazio... um poço sem fundo que se cava na alma, no qual eu não me acho.

Me questiono sobre o que faço aqui. Sobre quem sou. Sobre o que pretendo. Sobre o que me espera. E as respostas são difíceis de entender. Falam de coisas que eu sei, mas desconheço. Falam de alguém que vive em mim, mas não reconheço. Falam de uma recusa. Falam de um estranho que sou eu, de um outro que sou eu. Falam de mim... mas não sou eu. Não sei quem é esse eu.

Tem dias e dias continuados em que a depressão se apodera da minha alma e me deixa sem ser.

E nessas alturas eu não sei quem sou, nem como se vive. Eu não sei senão apenas respirar e tentar perceber a confusão imensa que me assola a mente, deixando-me prostrado, incapaz.
Eu fico... e espero... olhando tudo sem nada entender, olhando tudo sem nada ver... apenas, olhando o nada. Pois é de vazio e nada que então a minha vida se faz.

Quem sou eu? Onde estou?

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

DINHEIRO, FELICIDADE E NÉSCIOS

Todos os meus leitores em Portugal devem saber do caso, mas mesmo assim não quero deixar de aludir a este caso anedótico e surrealisticamente verdadeiro, não só para um breve comentário, mas para que os meus leitores não residentes neste país possam também reflectir sobre o episódio.

Há dois anos que 15 milhões de Euros esperam numa conta bancária a decisão judicial sobre o seu destino, entre dois contendores. E quem são estes?
Há dois anos um homem estava prestes a registar uma aposta no jogo do Euromilhões, quando recebe um telefonema da sua namorada para que apostasse mais 2 Euros que o habitual.
A aposta foi premiada com 15 milhões de Euros e os os amados passaram a odiar-se. Porquê?! Porque cada um reclama para si a propriedade do prémio.
O namoro terminou e o amor passou a ódio, que acabou por alastrar aos familiares de ambos.

Mais uma vez se pode perguntar se o dinheiro traz felicidade.
Eu digo sim, o dinheiro traz felicidade. Mas não a néscios!

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

CARNIFICINA E HIPOCRISIA, NA EUROPA

Onde está a sacrossanta defensora do bem-estar das espécies animais e dos ecossistemas; a Greenpeace?

As Ilhas Faroé, são um arquipélago autónomo dentro da comunidade dinamarquesa, tendo rejeitado a sua inclusão na União Europeia. Possuem um parlamento e governo próprios, embora contem com um Alto-Comissário representante da Coroa Dinamarquesa.
Povo altivo e orgulhoso aspiram à independência total da soberania dinamarquesa, para serem donos e senhores dos seus destinos. Enfim, os nacionalismos isolacionistas arrogantes ainda não se extinguiram.

Mas até aí tudo bem... não fora a usual persistência em tradições obsoletas senão mesmo abjectas.

Anualmente bandos de baleias-piloto, também chamados de baleotes - que embora sendo golfinhos recebem essas designações devido às suas proporções invulgarmente grandes para golfinhos - dão à costa nas praias das Faroé. Tal circunstância é utilizada pelos indígenas para levarem à prática uma tradição de ritual de iniciação dos jovens à maioridade, que consiste em chacinar o maior número de cetáceos numa orgia de sangue e selvajaria. O mar fica vermelho de sangue e os corpos brutalmente mutilados dos amistosos cetáceos amontoam-se na orla rochosa.

Todos os anos o macabro ritual se repete e todos os anos circulam discretamente as fotos da barbárie. Mas espanto meu; em nenhuma das fotos se vêem activistas da sacrossanta Greenpeace, intervindo em protecção dos cetáceos, nem de outras organizações defensoras da preservação dos animais.

Lendo sobre os usos e costumes da cultura das Faroé descobri que a baleia-piloto não faz parte de nenhum dos alimentos típicos da sua gastronomia, pelo que eles não estão caçando para se alimentar. Isso só me leva a concluir que o fazem apenas pelo prazer sanguinário da chacina na afirmação duma pseudo virilidade e arrogante autonomia, sintomática em ilhéus sob o complexo de inferioridade.

Mas como o povo das Faroé despreza a Europa e a sua União, assim essa mesma União faz vista grossa ao que se passa debaixo do seu nariz, mas tem logo um ferrete apontado quando se trata da caça à baleia por parte dos japoneses que, esses sim, têm a carne de baleia como uma iguaria tradicional da sua gastronomia.
Não estou defendendo os exóticos hábitos alimentares dos japoneses, mas me parece notável que a celeridade com que tantos meios se levantam condenando e mediatizando as suas práticas, não se vejam quando se trata dum costume tão infame ocorrente mesmo no coração da modelarmente civilizada Europa.

Nota: Este post foi-me sugerido por umas fotos que o meu amigo V. Brito me enviou, mas que eu me abstenho de publicar devido à enormidade do horror, que não pretendo de modo nenhum se torne pasto de voyeurismos sórdidos.