quarta-feira, 25 de julho de 2012

PRETÃO



Nêgão não. Pretão mesmo!

É todos os meses a mesma vergonha! No dia dos idosos e incapacitados receberem as suas pensões do INSS no Itaú, uma das duas sucursais dessa instituição bancária situadas no Largo da Paz (Afogados, Recife-PE) está sempre com o sistema informático em baixo e de portas fechadas. Coincidência assaz estranha.

Ora, tal infortúnio leva a que toda essa gente, com dificuldades e incapacidades, se tenha de deslocar para a sucursal vizinha. Aí, perante o acumular de gente de dois balcões em apenas um, gera-se a maior confusão e desnorteamento.

Colho informações aqui e ali e finalmente tomo o meu lugar no termo duma fila imensa. O local estava repleto. Uma muvuca heterogénea e incaracterística, onde predominava o mau gosto e a decadência, tentando esconder a miséria material de quem não nasceu com direito a sombra. Senão àquela com que os mais ricos exploram os mais desvalidos.

O meu olhar vaga por sobre as cabeças velhas e irrequietas. Lá à frente, acima do mundim, destaca-se um jovem alto e forte. Delicioso tom de chocolate negro, de carnes cheias – sem ser gordo, nem nenhuma daquelas aberrações hiper-musculadas, entufadas de esteróides anabolizantes. A tez negra coruscava e brilhava acima da populaça perfilada e amontoada. Alto e distinto, com um porte nobre, mas humilde, era um farol, um magneto atraindo o meu olhar, sempre ávido de beleza. O negro dos ombros musculosos, espreitando além das alças da camiseta, destacava-se da massa informe de cabeças nervosas. Com calma e suavidade amparava a mãe que mostrava dificuldade de locomoção. Paciência de filho amoroso denunciada pelo sorriso feliz e orgulhoso da senhora. Bem ela se podia orgulhar, não só da beleza que pariu, mas do excelente carácter humano que o sereno e carinhoso olhar dele denunciava.




Foto da trilha bloqueada, feita por mim no banco.


Contudo algo anacrónico me distraía da beleza núbia do mais olímpico ébano. Como manda a lei e a solidariedade cívica, desde a porta de entrada estendia-se pelo chão e até um dos balcões de atendimento, o trilho táctil destinado aos cegos (que é assim o nome que me ensinaram em criança, sobre as pessoas com incapacidade visual e que nunca achei que fosse desrespeitoso). Só que chocado notei que sobre esse trilho tinham colocado cadeiras. Além de que, devido à má organização e gestão dos espaços, a fila de outro balcão se estendia igualmente sobre ela, quando deveria estar livre em toda a sua extensão. Eu mesmo, me via obrigado a permanecer sobre a trilha, para respeitar a minha vez.

Se as pensões que as pessoas recebem não fossem miseráveis, elas não teriam de correr logo pela manhã do dia de pagamento, para a boca do caixa. Se auferissem o bastante para viverem dignamente e com tranquilidade poderiam ir a qualquer hora e em qualquer dia fazer os seus resgates com dignidade. A dignidade que todo o ser humano merece. Tanto a pessoa a quem eu estava prestando uma ajuda, como a mãe do belo mancebo e ele próprio em todo o seu esplendor de beleza e juventude. Todos ali éramos seres humanos tratados como mercadoria, útil apenas para o enriquecimento dos banqueiros e accionistas bancários. 

domingo, 22 de julho de 2012

À LA CARTE

Enquanto a cavalgada corre em desfilada e a cáfila não sossega e se organiza salutarmente, vamos dar um pequeno passeio por coisas que gosto de olhar e apreciar.

Floresta ou catedral?


Anel de fogo


Pão e enchidos




Trabalhador negro
Foto por Adenor Gondim


Power House Mechanic 
Foto por Lewis Hine




Presuntos




quarta-feira, 11 de julho de 2012

PRETO



Desci do Zumbi Pacheco e ao iniciar a minha caminhada, rumo ao meu destino, ouvi um chiar urgente de pneus. Em alerta os meus olhos procuraram a origem da emergência e acharam a mancha preta dum automóvel, travando atrás duma mota preta, empurrada e já tombando, derrubando o motociclista vestido de preto e usando um capacete preto.

- Foda-se! – Deixei escapar, mesmo em voz alta. Tudo que eu não quereria assistir naquele momento e nunca, era o espectáculo pungente dum motociclista trucidado pelos rodados doutro veículo.

O trânsito intenso da avenida central não se detinha, o que me dificultava a percepção. Desviava-se com alguma cautela e seguia indiferente. Afinal era tão somente mais um caso de motociclista atropelado pela falta de educação cívica no tráfego brasileiro. Motociclista só não é uma espécie em vias de extinção neste pais porque motas são os veículos motorizados mais vendidos, segundo as estatísticas. E o seu número continua aumentando  exponencialmente.

Mas quanto a este acidente fiquem tranquilos. O motociclista levantou-se pelo seu próprio pé, sem sequer um arranhão pois a roupa adequada o protegeu. Agentes da policia estavam perto e tudo terminou calmo, sem dramas. Mas, infelizmente, na maior parte dos casos não é assim.

sábado, 7 de julho de 2012

PELUDINHO



Magrinho, baixinho, mesmo a minha medida. E sem as pernas e os braços rapados! Contrariando a moda e tendência, por estas bandas. Peludo como um homem deve ser, se o for naturalmente.

Não que um homem tenha de ser obrigatoriamente peludo. Não é a quantidade de pêlos que define ou indica, a virilidade dum homem. Nem é pelo facto de ele se depilar que vai ficar menos macho. Contudo eu prefiro um homem ao natural. Com mais ou menos pêlos mas, sobretudo, como ele mesmo é. Não sou muito simpatizando de certos extremos dessa vaga de metrossexuais, que parecem mais bonecos de capa de revista que gente de verdade.

Ok! Ele tinha umas madeixas louras no cabelo negro, que lhe iluminavam a cabeça e o rosto bonito. E daí? Isso em nada desmerecia a sua masculinidade.

A profusão de acessórios ou artefactos, que um homem possa ostentar, não macula a sua virilidade. Sempre o ser humano utilizou a arte de se maquilhar como interventora social. O aspecto pessoal tem um significado simbólico nas relações inter-sociais. E em várias culturas ancestrais cabe ao homem o dever de se adornar tornando-se mais exuberante e cativante. Tal como certas espécies animais.

Calção e camisa desportiva. Chinelos de borracha nos pés bonitos. Carregava as compras que trazia do supermercado. Dava até para adivinhar o seu companheiro esperando-o em casa, com o almoço já quase pronto.

Vida conjugal é assim; partilha de tarefas.

terça-feira, 3 de julho de 2012

OS ANJINHOS



Educar não é oprimir nem reprimir, mas sim ensinar limites. Despertar a consciência de si entre os outros.

Viver sem limites é criar o caos. E quem vive sem limites acaba isolado e só.

Aconteceu na minha presença: A criança largada no Museu de Energia Nuclear, sob o olhar irresponsável dos pais, arranca o expositor da parede e escaqueira tudo no chão. Vergonha! O espanto e indignação geral de todo o grupo de visitantes. Os pais... nem uma palavra de admoestação. A criança... continuou sorrindo e brincando. No chão ficaram cacos de vidros e de cristais de quartzo, que tinham sido tratados com radioactividade para tonalização.

Todos parecem querer delegar na escola aquilo que não fazem em casa: educar. A escola não educa a personalidade de crianças. Não é essa a sua função. A escola ensina. A educação duma criança começa e faz-se em casa, com a família.

Criança não conhece limites. Cabe aos pais a função de dar à criança o entendimento da importância do respeito pelo seu espaço e o espaço dos outros. É no lar que a criança procura modelos. Junto daqueles que ele primeiro ama e em quem se inspira. Se só lhe mostram e dão bagunça no lar, é isso que ele levará como modelo para o resto da vida.

E os outros que se lixem!



Nota: Quanto ao incidente no Museu, podem ficar tranquilos que não houve riscos de contaminação radioactiva. Embora tivessem sido tratados com radioactividade os objectos não eram radioactivos. Tal como ninguém fica radioactivo depois duma radiografia.