sábado, 27 de dezembro de 2008

JUíZES DE SOFÁ

Refastelamo-nos comodamente no sofá, pegamos no tele-comando, ligamos o televisor e, como que por magia, tornamo-nos em julgadores de todas as causas. Verdadeiras divindades omniscientes. 

Em micro-segundos analisamos qualquer notícia, que no pequeno écran se apresente e logo decretamos a mais instantânea sentença. 
Tão simples assim, ser juiz em causa alheia.

Árabes e judeus, paquistaneses e indianos, a pirataria marítima, o descalabro civilizacional do Zimbabué, o ressurgimento do poderio estratégico-militar da Rússia, os atentados terroristas aleatoriamente ocorrentes em qualquer parte do globo e tantas outras situações, mais ou menos dramáticas, mais ou menos fúteis, sobre as quais nos achamos no direito de assumir o papel de doutos pensadores proferindo as mais sábias opiniões.

Somos todos senhores da verdade e os mais acérrimos defensores dos direitos humanos. 

Decretamos sem hesitar a mais despótica sentença sobre qualquer prevaricador, de quem nos tenha sido dado notícia, sem nos questionarmos sobre os modos como essa informação chegou até nós, ou a autenticidade dos pormenores relatados.

No conforto das nossas salas climatizadas, nos apressamos a nomear e vilipendiar os algozes da fome e de todos os infortúnios dos povos oprimidos na miséria. Depressa temos uma opinião acusatória sobre os governantes de países que fogem ao modelo tido como democrático das nossas nações de abastança. Apontamos um dedo acusador e vexatório aos USA por não assinarem nem respeitarem as directrizes ambientais do tratado de Kyoto, mas não prescindimos dos nossos luxos igualmente poluentes, nem nos preocupamos sequer em dividir os nossos lixos domésticos para posterior reciclagem. Achamos infame os japoneses matarem baleias por ser um alimento tradicional da sua cultura, mas não questionamos os nossos produtores de carne sobre o modo como tratam os animais destinados à nossa alimentação. Insurgimo-nos contra a modernização do Tibete por parte da China, mas não nos mobilizamos individualmente para proporcionar a restituição da dignidade de tratamento aos nossos velhos esquecidos em asilos e lares de acolhimento, ou mesmo em aldeias fantasmas perdidas nas serras do interior.

Do alto púlpito do nosso sofá temos a mais justa das opiniões sobre todos os males do mundo. Mas não basta ter opinião para mudar o mundo!
É preciso mãos e empenho para que as coisas mudem!

Mas isso é pedir demais... Melhor mesmo ter opinião e vir aqui ao virtual Speakers' Corner despejar sermão.

quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

VIDA

Muitos vêem a vida como uma busca da felicidade. Uma felicidade baseada em ilusões e aspirações dirigidas à posse e ostentação de bens materiais e daquilo que chamam de desafogo. Uma vida de enganos e frustrações.

Não me vejo melhor nem pior que os demais. Apenas aprendi a viver à minha maneira, do meu modo, do jeito que o percurso peculiar da minha existência me foi ensinando. E assim fui aprendendo a valorizar o que tenho e respeitar tudo o que me rodeia.

Não sou pregador, nem arauto de dogmas alheios. Apenas posso falar por mim e de mim.

A vida é uma aventura, em que diariamente me lanço como se fosse o primeiro dia duma longa jornada por percorrer. 
Não me interessa o desfecho. Apenas estou aqui pelo presente.

Mas há coisas que evito; tal como o juízo e a culpa, tanto meus como alheios. Não são bons companheiros de jornada, nem trazem consigo paz e tranquilidade. Erros?! Sim, todos os cometemos. Mas no fim de cada jornada diária avalio os procedimentos e pondero sobre o modo como poderei me melhorar, tornando-me uma melhor pessoa; de modo a ter uma existência mais harmoniosa comigo e com os outros.

Alguns me chamam de irresponsável, perante a ousadia em que avanço para terrenos desconhecidos, largando tudo e lançando-me no vazio. Por vezes tenho aterrado, mais ou menos suavemente, outras tenho me estatelado dolorosamente. Mas é dessas quedas doridas que mais proveito (de alma) e ensinamento tenho tirado.

Por isso muitos não me entendem e deixo-os completamente desconcertados, por me verem com mais de meio-século de existência, vivendo ainda como se tivesse quinze anos; acreditando no sonho e me entregando com puerilidade nas vagas imponderáveis da Fortuna.

Espero assim continuar. Atentarei para assim continuar. É nesse viver intrépido e sem rumo, aceitando o que eu alcanço e os outros me proporcionam, que eu entendo que está a felicidade.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

TINO

O Tino deitou-se cedo, como habitualmente e adormeceu.

Na manhã seguinte o Sol já não o viu despertar. Partiu tão tranquilamente como nos recebia em sua casa, com fraterna disponibilidade.

Não importa se eu o conhecia à muito ou pouco tempo. Não importa quantas vezes com ele convivi. A amizade mede-se noutros tempos e por outras empatias. Especialmente quando essa amizade é oferecida de Coração Aberto, como o Tino o fazia.

Para sempre ficarei em dívida para como ele, pelo modo carinhoso e de incondicional disponibilidade, com que acolheu no seu Lar alguém que me é muito querido. 
Mas não é por isso que o elegi como Amigo, pois Almas assim não se definem por adjectivos. Almas que palmilharam a vida de olhos abertos e aprendendo o Sentido das Coisas e o Valor de Tudo.

Havia no Tino a Verdade dum Calor no estreitar de mãos, dum Brilho de Acolhimento no seu olhar risonho e puerilmente eloquente. 
Não esquecerei nunca a Alegria estampada no seu olhar quando, de avental na cozinha, preparava diligentemente uma cabidela de lampreia. Soubera que eu nunca tal houvera comido, pelo que logo se dispôs a proporcionar-me a degustação de tão requintada iguaria.
Era um homem de poucas palavras e gestos discretos, mas ambos profundos e plenos de sentido.

Ele deitou-se e adormeceu tranquilamente, como merecia. Não acordou mais. E o mundo ficou mais vazio. Mas as nossas memórias ficaram ricas com o testemunho dum Homem simples e discreto, que sabia fazer da vida um grande acontecimento.

O Tino partiu! Resta-nos o aconchego das memórias agradáveis e as lágrimas da saudade.

sábado, 13 de dezembro de 2008

MORTE NA CASA PIA

"Mas que se passa? Então isto não é uma ameaça?!"

Os mais velhos decerto lembrarão este estribilho duma canção do pós-25 de Abril. Os mais novos e que não viveram esses anos auspiciosamente conturbados da História recente de Portugal, poderão não conhecer a canção do Fernando Tordo, mas por certo que o estribilho lhes fará sentido.

Esta semana foi assassinado um jovem de 18 anos em plena cantina da Casa Pia, no decorrer duma batalha campal durante o almoço. Ao que consta uma horda de jovens arruaceiros de bairros periféricos invadiram as instalações do colégio, nomeadamente a cantina onde se servia o almoço, para um ajuste de contas entre bandos rivais.

Isto tira-me do sério e vou directo aonde mais magoa, sem rodeios.

Afinal onde está a merda de Socialismo deste dito Partido Socialista que monopoliza o poder neste país?

Um governo que é todo mãos largas para salvar os ricos dos seus azares gananciosamente especulativos, desbaratando milhões do erário público a salvar as fortunas dos ricos ao resgatar bancos vocacionados em ganhar dinheiro com especulação de dinheiro, sem que dessas actividades resulte algum proveito para o bem-estar da população em geral.

Um governo que quando se trata de disponibilizar verbas para uma melhoria das condições de vida dos mais carenciados, nunca tem dinheiro e distribui esmolas que mal dão para substituir uma telha numa escola a cair.

Um governo que é cego à escandalosa degradação a que chegou a situação da Casa Pia.
Já não bastava a lenta agonia do infame processo de pedofilia envolvendo a vetusta Instituição, como agora ainda temos que assistir à ignomínia duma batalha campal em pleno refeitório com vários feridos e uma vítima mortal.

Sempre ouvi dizer que "depois de casa arrombada, trancas à porta", mas ao que consta este governo (responsável máximo pela Instituição em questão, uma vez ser instituição pública de responsabilidade estatal) não quer aprender mesmo e segue na sua arrogante atitude de apenas olhar para as cifras dos relatórios financeiros e dos interesses dos seus acólitos e promotores.

Portugal já vai além da República das Bananas, agora já é em definitivo o Couto dos Cartéis.

domingo, 30 de novembro de 2008

NOMES

Aos 19 anos comecei a trabalhar nas antigas fábricas da Quimigal (ex-CUF). Aos 19 anos os meus pais morreram e eu fiquei morando sozinho em casa deles, um apartamento enorme de 5 assoalhadas.

Os nomes que aqui referirei são verdadeiros, embora talvez alterados ou não, para que não haja uma identificação por terceiros; mesmo que já se tenham passado algumas décadas sobre os factos aludidos. Usei deliberadamente os nomes próprios, pois normalmente a maioria deles eram mais conhecidos pelos seus apelidos.

As fábricas da Quimigal já foram desactivadas e desmanteladas, mas delas guardo a memória das minhas aventuras sexuais, ou direi homossexuais, lá vividas. Período da minha vida, prolífero nas mesmas, até por dispor dum local privilegiado para a consumação desses desejos.

Quero ainda referir que todos estes casos se passaram com operários, tidos como a classe menos culta de toda a hierarquia laboral e social. Será mesmo assim? Não creio, pois alguns se mostravam interessados nas artes de ler e filosofar. Assim os comportamentos que aqui referirei não se podem justificar pela incultura, até porque tive o mesmo tipo de experiências com indivíduos de classe social mais elevada e com formação académica.

Jorge, casado, pai. Fomos amantes durante vários anos. Antes de mim já tinha tido outro caso extra-conjugal de um relacionamento homossexual estável, que também durou alguns anos.

Helder, casado, pai. Assumia a sua bissexualidade, embora a escondesse em casa. Foi ele que me introduziu na minha primeira experiência homossexual a três. Costumava dizer-me que eu era o complemento que faltava no seu casamento para ele ser feliz.

Josué afirmava-se como um curioso sexual. Namorava uma jovem, com quem se pretendia casar. Conheci-o numa sessão de sexo entre três homens.

Filipe, casado, pai. Era bem jovem como eu e a loucura juvenil levou a termos sexo no próprio autocarro que a empresa alugara para transportar os trabalhadores entre o local de trabalho e as suas zonas de habitação.

Paulin(h)o, casado, pai. Nunca chegou a ir a minha casa, pois dávamos largas aos nossos desejos sexuais em locais mais escondidos dentro da zona fabril. Eram aventuras empolgantes, devido ao risco que corríamos de sermos descobertos. Chegou a propor-me que se divorciaria da mulher se eu aceitasse viver com ele.

Simpliciano, homossexual que tentava por todos os meios esconder a sua homossexualidade. Acabou por casar, "para manter secreta a sua homossexualidade", como ele me afirmou. "Mas continuarei a procurar homens para ter relações sexuais com eles" assegurou-me ainda.

José, jovem ainda, namoriscava raparigas e encenava tentativas de resistência aos meus avanços sexuais. Acabou por ceder de boa vontade, pois por muito que se mostrasse incomodado com as minhas tentativas e assédios, nunca deixou de me procurar, mesmo em minha casa. É casado e pai.

Vítor, casado e pai. Perseguiu-me até eu anuir em ter relações sexuais com ele. Também, certa vez, fez-se acompanhar dum amigo para termos uma sessão de sexo a três.

Ivo, casado, pai. Também me cortejou até eu aceder a ter relações sexuais com ele.

Hugo, casado, pai. Tínhamos sempre relações sexuais nos balneários, quando mais ninguém se encontrava lá.

Helder (outro Helder), casado, pai. Esperávamos que todos abandonassem o balneário para depois termos relações sexuais lá.

Júlio, casado, pai. Bissexual assumido. Perseguia-me continuamente para ter relações sexuais com ele.

Octávio, casado, pai. Cortejava-me com muita delicadeza, mas inibia-se quando era o momento de me propôr aquilo que era sua intenção: o foder comigo. Eu perante a sua cobardia nunca fiz o mínimo esforço de o encorajar, embora desejo não me faltasse. Contudo a sua cobardia indignava-me, por isso o punia não o ajudando a vencê-la e a concretizar os seus mais que óbvios desejos.

Ernesto, casado. Cortejavamo-nos romanticamente. Morreu, ainda bem jovem, de leucemia, antes de havermos consumado o desejo mútuo de nos possuirmos sexualmente um ao outro.

João, casado, pai. Fanfarrão a quem acabei por aceder às suas múltiplas tentativas de me seduzir. O seu entusiasmo e desejo eram de tal modo empolgados que, no primeiro e único encontro íntimo que tivemos atingiu o orgasmo nos preliminares, ainda antes de havermos consumado qualquer prática de cópula.

Flávio, casado, pai. Indivíduo bem disposto e aventureiro, chegámos a ter contactos sexuais perante terceiros, sem que estes dessem por isso. Éramos peritos na arte da dissimulação. E isso divertíamo-nos imenso. Afinal o sexo também pode ser lúdico.

São apenas alguns exemplos da minha experiência com heterossexuais assumidos, mas sempre prontos a se envolverem sexualmente com outros homens.

Não referi aqui os casos que durante anos me assediaram e a cujas tentativas resisti, por uma razão ou outra. Afinal com uma lista de opções tão variada eu dava-me ao luxo de escolher os que mais me agradavam.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

POVO COBARDE

E foi sempre assim... os portugueses como povo, sempre assumiram como suas as vitórias e encontraram bodes-espiatórios para os fracassos.

Li esta manhã um título num matutino que anunciava o resultado de 6-2 do jogo de futebol de ontem, entre a selecção portuguesa e a selecção brasileira: "Selecção de Queiroz humilhada na capital brasileira".

Típico! É caso de dizer: "mesmo à portuguesa!" Caso o resultado tivesse sido o inverso adivinho que o título no mesmo jornal seria: "Selecção nacional humilha selecção brasileira na sua capital".

Eu chamo a isto de cobardia e mesquinhez, dum povo com baixa auto-estima e imaturo.

Maturidade é também saber assumir as suas limitações e as suas derrotas. Maturidade é saber continuar em frente, de cabeça erguida, mesmo que não nos aplaudam e entoem que somos os melhores do mundo. Maturidade é saber construir uma identidade própria pela elevação cívica de todos os indivíduos e não, esperar que uma selecção de futebol seja um símbolo da excelência dum país.

Um país que se revê nos resultados duma equipa de futebol é um país menor. Perdido na sua falta de identidade nacional.

Eu considero-me um apátrida exilado, mas assumo a minha identidade africana e revejo-me em todos os sucessos e fracassos dos diferentes povos do meu continente-mãe; que é também o continente-mãe de toda a Humanidade.

Podemos ser um continente flagelado e martirizado por todo o tipo de sevícias, mas nós africanos, somos povos que acreditam num amanhã possível. E aparte todos os desaires dos diferentes povos que compõem esta imensa manta-de-retalhos humana, somos orgulhosos da nossa natividade e identidade africana!

terça-feira, 11 de novembro de 2008

SIGUR RÓS, LUIS

16 de Setembro, dia do meu aniversário. 
Meu Irmão-de-Alma, o Luis, deu-me opção de oferta de aniversário, um ingresso para o espectáculo dos Mercury Rev em Lisboa. Eu optei pelos Sigur Rós. 
E lá estivemos os dois hoje, 11 de Novembro, assistindo ao show dos quatro islandeses no Campo Pequeno.

Final de tarde outonal, já com a noite vestindo tudo de sombras e negro. A cidade retirava-se apressada para as periferias, após mais um dia de trabalho cumprido. 
Eu chegava ao monumental edifício, iluminado pelas luzes feéricas duma urbe moderna e capitalista.
Levava comigo apenas a expectativa de assistir a mais um espectáculo musical. Tão somente.

Após várias vindas da banda a Portugal era a primeira vez que eu concretizava a vontade de os ver tocando ao vivo. 
O público ia chegando sem pressa, tranquilo. Dentro do vasto recinto a atmosfera ia-se moldando para o ritual sonoro que se aproximava. E quando tudo se apagou, menos umas velas acesas e dispersas pelo palco...

A música feita magia!

Num palco vestido de negro quatro criaturas encarnando a música, faziam de cada nota, de cada acorde uma metamorfose sonora encantatória, desabrochando perante nós em deleite e pureza. 
A voz de falsete pueril, com o seu timbre tão peculiar, de Jónsi Bigirsson, sussurrava e entoava frases numa língua imcompreensível, mas que todos entendiam. Uma voz familiar, por todos identificada, de tão desbragadamente infantil; a voz da criança adormecida dentro de nós. 
Voz, mais que cantando, dançando em enleios planantes com as enebriantes sonoridades que Jónsi libertava da sua guitarra eléctrica, ao tocá-la com um arco de violoncelo (o seu estilo muito pessoal).
O cenário enchia-se de cor e formas. Sombras e imagens diluídas na intenção de mostrar sem desvendar; ou o inverso.

Poderia ficar aqui desfiando linhas de prosa ou verso, em longos arroubos de inspiração, mas nunca conseguiria descrever o êxtase de tão singular ritual.

Orgástico! Espiritualmente orgástico!

Bem-hajas, bom Luis, por estes momentos inesquecíveis.

domingo, 9 de novembro de 2008

SORRY, PETER GABRIEL



"Peter Gabriel saiu dos Genesis e toda gente se pôs de pé!" era título na imprensa da época, aquando da saída de Peter Gabriel dos Genesis, como se para compensar a sua saída fosse necessário um esforço suplementar dos restantes membros do agrupamento musical. Como se com ele tivesse ido a alma e o espírito criativo dos Genesis.

Também a mim me foi difícil aceitar , na altura, a saída do carismático vocalista, pois isso prenunciava o final das extravagantes apresentações teatralizadas dos espectáculos da banda. Havendo mesmo muitos agoirentos fã(nático)s incondicionais que viam nesse abandono o fim do projecto musical e o desaparecimento da banda no seu apogeu. 
"A qualidade musical vai diminuir!", "A mística acabou!" eram lamentos recorrentes entre os velhos-do-Restelo. Mas não foi tanto assim! 
O que terminou foi apenas a teatralização mascarada dos temas musicais nas apresentações ao vivo. A qualidade e mística das músicas e temáticas permaneceu ainda, por mais algum tempo.

A verdade é que o génio criativo dos Genesis residia naquela figura apagada, sentada no canto esquerdo do palco (visto da perspectiva do público), tocando as suas guitarras com uma discreta postura, quase como se a sua presença fosse perfeitamente descartável. 
Era ele Steve Hackett. Aquele de que apenas se falava referindo-o como o guitarrista sentado lá ao canto.

Na verdade foi Steve Hackett que impôs à banda o modelo de apresentação cénica dos espectáculos ao vivo, aproveitando a bipolaridade de Peter Gabriel (P. G. sofre de Doença Bipolar) que lhe proporcionava uma plasticidade necessária para encarnar as várias personagens e narrativas dos temas musicais. 
Quando a banda convidou Steve Hackett para guitarrista ele impôs como condição refazer toda a postura em palco da banda e o modo como os espectáculos deveriam ser montados e encenados. 

Foi do génio criativo de Steve Hackett que nasceu o formato de espectáculo de rock cénico que tornou os Genesis famosos e serviu de modelo para muitos outros músicos e bandas, que neles se inspiraram para idealizar os seus espectáculos.

E para sossegar os fãs e a crítica, logo saiu o álbum "A Trick of the Tail", que para espanto de todos mantinha tudo aquilo que definia a sonoridade tão peculiar dos Genesis. Até a voz de Phil Collins encaixava perfeitamente no som, tal como antes acontecera com a voz de Peter Gabreil. 

Afinal os Genesis tinham vida para além de Peter Gabriel! 

Sim, tinham e tiveram por muito mais tempo e com muito sucesso também. E a mística musical e temática permanecia lá! Um olhar do mundo com algum surrealismo, alguma ironia e muito de onírico e devaneio. Pois, a mística  permanecia, porque o obreiro dela tinha um nome: Steve Hackett. 
Sorry, Peter Gabriel! But that's the truth!

Depois de dois álbuns gravados após a saída de Peter Gabriel, a banda (e a editora) entendeu que deveria acompanhar as mudanças dos gostos da época e de novas gerações de fãs e então Steve Hackett reconheceu que era o momento de sair, pois aquele não seria mais o seu projecto. Chegara o momento dos discos por encomenda para vendas maciças a engordarem as contas bancárias das editoras e demais tubarões empresariais.

Mas o génio ficou! Contudo não na banda, que enveredou por caminhos ínvios e incaracterísticos, com algumas tentativas trôpegas de imitar o clima dos velhos tempos, mas que não passavam de infrutíferos arremedos grosseiros. O génio místico dos Genesis viveu fora deles, nos álbuns a solo de Steve Hackett e na sua carreira musical, desde o seu abandono do projecto Genesis. Viveu e livre das restrições relacionais complexas duma banda de rock, desenvolveu todo o seu potencial criativo, registado em inúmeros trabalhos, para felicidade de quem se propuser a apreciá-los sem preconceitos e pré-juízos.

Para os que o queiram confirmar faço duas sugestões, começando pelo seu segundo álbum "Please Don't Touch", tão rico em ambientes que nos levam de enlevo em enlevo, como se vagueássemos  numa mágica feira de fantasias. E depois o show gravado no Japão "The Tokyo Tapes" e editado em DVD, onde Hackett conta com a cumplicidade de outros músicos de bandas como King Crimson, Asia, Weather Report e outras.

Mas estes são apenas dois exemplos da vasta discografia de Steve Hackett, distribuída por várias áreas da composição e interpretação musical.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

O NÃO-TEXTO

Hoje queria ter vindo aqui falar sobre o auspicioso momento da eleição de Barack Obama.
Hoje gostaria de ter vindo aqui falar da importância da união entre povos e nações.
Hoje gostaria de ter escrito um poema no LokFeyl.
Hoje gostaria de ter feito muita coisa, mas tive de acudir a um Amigo. Alguém que me é muito querido e que me dói a alma vê-lo sofrer, sem um queixume, sem um lamento de auto-comiseração. 
Hoje acudi um amigo tal como acontece quando o mesmo sucede com qualquer um dos meus outros amigos. Contudo alguns parecem ser penalizados demais. E por isso chorei.
Sim, os homens também choram. E chorar é bom. Principalmente quando esse choro também assume a forma de prece.
Hoje eu gostaria de ter falado sobre como é importante a Humanidade tomar consciência de que somos um Todo. Um Todo composto de muitas partes únicas... e tão singulares na sua essência divina.
Hoje eu gostaria de ter tido a cabeça mais desanuviada. Mas... tudo correu de um outro modo.
Contudo o desalento não vence! E amanhã virá o dia em que já poderei voltar em forma, para vos brindar com mais um texto.
Hoje o dia foi de quem mais precisou duma mão amiga a quem se agarrar e dum afago na fronte para reconfortar uma Alma sofrida.

sábado, 1 de novembro de 2008

O GARROTE

Haja alguém que me explique porque estarão despejando Portugal em Lisboa.
Perante as políticas centralizadoras deste governo, começo a entender a ideia de que para lá de Lisboa o resto do país é um deserto.

Há indicadores preocupantes na política portuguesa de que nem tudo é tão claro e transparente quanto deveria ser em democracia. Não acredito que néscios cheguem ao poder em parte alguma e isso me induz a ficar mais de sobreaviso. 

Agora querem garrotar Lisboa com um paredão de contentores. Ãh?!!!...
Vão-se gastar milhões numa extravagante obra de malabarismos múltiplos, envolvendo várias vertentes. Entre as quais mais um túnel junto ao rio, em solos permeáveis!!! Bem se poderia direccionar essas verbas para a beneficiação patrimonial arquitectónica da cidade, tão mal tratada e descurada.
Lisboa tem potenciais turísticos como muito poucas cidades. Porque não aproveitá-los e dinamizá-los, em vez de insistir em políticas terceiro-mundistas de industrialização centralizada?
Afinal para que serve o porto de Sines??? Porque não enviar para lá os contentores e desenvolver uma rede ferroviária nacional inclusiva (uma rede que facilitasse o acesso ferroviário a todas as regiões do país, tanto para pessoas como para mercadorias)? 
No mínimo seria mais ecológico que esta política do asfalto, deliberadamente exterminadora das vias ferroviárias tradicionais remanescentes. Já para não falar no impulso que tal medida daria ao desenvolvimento económico do Alentejo (coisa que aquela monstruosa aberração da barragem do Alqueva não fez, nem fará).

Os militares estão descontentes com as suas condições contratuais. E oiço um sénior militar (um ainda remanescente dos apelidados Capitães de Abril) afirmar que não se passa nada com os militares, uma vez que eles fizeram o 25 de Abril , que possibilitou a democracia e que jamais os militares iriam por em causa a integridade dessa democracia. Sim, meu caro, mas não foram estes militares de hoje que fizeram o 25 de Abril à 34 anos (muitos deles ainda nem tinham nascido). Já para não falar nas razões que motivou o levantamento dos capitães... cala-te boca!
As forças armadas portuguesas deixaram de ser uma incorporação forçada de campónios incultos. Os militares agora são profissionais. A mim parece-me que há aí uma pequena diferença. Não acham?

A Assembleia da República repudiou a discussão da regulamentação dos casamentos entre pessoas do mesmo sexo, invocando o Partido dominante e dominador, haverem outros assuntos sociais mais prementes a discutir e resolver de âmbito geral. Mas depois só oiço falar em Magalhães para cá e Magalhães para lá. Tendo-se chegado ao cúmulo (que vergonha eu teria se me considerasse português!) de o Primeiro Ministro armar em vendedor de banha-da-cobra, aproveitando uma cimeira internacional, onde era suposto debater-se assuntos de suma importância e que muito preocupam todo mundo, para fazer uma sessão de propaganda do Magalhães.

Como diria qualquer um dos meus amigos brasileiros: HAJA CU!!!

domingo, 26 de outubro de 2008

PAULO

Noite.

Os véus de Apóphis velaram o Sol. 
O Reino das Sombras invade o Mundo deixando-nos sós, perante o receio de olhar o vazio que de fora se precipita para o fundo das nossas almas.

O Mundo pára e adormece. 
Apenas as sentinelas da Luz permanecem nos seus postos.

No meu recanto de solidão eu me entrego ao Sonho, embalado pela música que me leva em viagens sem destino, por planos e espaços que a forma física não pode alcançar. E aí encontro a tua lembrança, as tuas palavras, os teus escritos, os teus sentires, os teus sentimentos, as tuas dúvidas e as tuas certezas. 
A singularidade da tua pessoa. A quem estendo a mão e... quase posso tocar. 
Mas apenas nos resta o quase...

À minha frente a negra parede do vazio, rasgada pela janela luminosa que nos permite contactar através da voz das nossas almas. Tão simultaneamente virtual e real, como a Amizade e Cumplicidade com que não nos tocamos, mas nos conhecemos.
Irmão Guerreiro, te ofereço a minha asa de Dragão. Voemos!

PS: ao Paulo do Sidadania. Almas como a tua nos fazem dar sempre mais um passo adiante.

sábado, 18 de outubro de 2008

MANUEL ALEGRE, AGAIN

A pedido e por sugestão, volto ao tema do voto e das afirmações de Manuel Alegre, sobre a apresentação à discussão na Assembleia da Republica de dois projectos de lei sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo; homossexuais para sermos mais claros.

Não retiro nada do que afirmei no meu post anterior apenas porque o deputado do PS em questão desrespeitou a disciplina de voto do seu partido para votar segundo a sua consciência.

Eu assisti à entrevista que passou na TV (SIC Notícias, Jornal das Nove, com Mário Crespo) em que ele explicou que votara favoravelmente por que se não o fizesse iria contradizer afirmações suas que proferira quando em campanha eleitoral para as presidenciais. De igual modo na mesma entrevista, ele se retratou de ter sido áspero e despropositado nas afirmações que havia proferido em relação à participação da JS neste caso.

Não nego o empenho que o deputado-poeta possa ter em relação aos direitos das minorias (serão assim tão minorias?), mas atendendo às suas palavras ele apenas votou <sim> para não cair em contradição com as afirmações favoráveis aos interesses dos homossexuais num momento em que se pode dizer tudo para ganhar votos.

Quanto às afirmações terem saído dum impulso rude e imponderado... bem, isso não é comportamento que se espere de quem pretende ocupar o cargo mais elevado na hierarquia nacional. Quem se arroga o direito de alguma vez ter tido e poder ter de novo, interesse em ocupar tal cargo deve ser mais ponderado nas suas afirmações aos chacais da informação.
Os temperamentalismos deve deixá-los para a poesia, que aí serão completamente permitidos.

Concluindo; reconheço ao Sr. Manuel Alegre a nobreza do gesto de se ter vindo retratar em público, contudo para mim, tudo agora que o deputado-poeta afirmar fica sujeito ao benefício da dúvida. Ou para ser mais claro, continuo a ter dúvidas quanto às verdadeiras intenções políticas do Sr. Manuel Alegre. Afinal o que faz ele naquele partido-partido?

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

SOU LIVRE

Eu sou um homem livre.

Eu não tenho um emprego. Eu não tenho que gerir a minha vida por um quotidiano rigidamente ordenado em função dum horário laboral. Não tenho um salário para prover às minhas necessidades de subsistência básicas.

Eu sou um homem livre.

Não tenho uma casa minha, nem tão pouco alugada (já que não tenho uma fonte de rendimentos que me permita suportar esses encargos financeiros). Moro em casas de amigos graças à sua benevolência e amizade.

Eu sou um homem livre.

Durmo indiferentemente de dia ou noite. As patologias que me afectam baralham-me as rotinas e a medicação torna-me trôpego e lânguido.

Eu sou um homem livre.

Não tenho fontes de rendimentos para prover à minha subsistência. Tento malabarismos financeiros com as parcas poupanças que me restam.

Eu sou um homem livre.

Como com gula e sem critério, pois a ansiedade desregula o meu metabolismo e qualquer sentido de disciplina que eu gostaria de me impor.

Eu sou um homem livre.

Posso ir e vir sem ter que dar satisfações a ninguém, pois não tenho nenhum companheiro amante com quem partilhar a minha intimidade. E de quem receba e a quem dê carinho e dedicação.

Eu sou um homem livre.

Elejo e venero as divindades que aprovo e a quem me disponho a orar, não aceitando dogmas de religiões institucionalizadas.

Eu sou um homem livre.

Sigo os impulsos do momento, sejam-me eles ditados pela minha vontade ou por algum instinto ou anseio inconsciente.

Eu sou um homem livre.

Porque sou feliz por ser apenas Eu. Feliz por ser quem sou. E por ter a coragem de ser Eu.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

BYE-BYE MANUEL ALEGRE

Significativa a admoestação que o deputado-poeta do PS (Partido Socialista) Manuel Alegre, fez à JS (Juventude Socialista) por esta insistir na discussão e aprovação, pela Assembleia da República, de regulamentação do casamento entre pessoas do mesmo sexo; o chamado casamento de homossexuais.

Referia-se o deputado (e muitos dos intervenientes políticos cá da praça, seguem o mesmo argumento falacioso) que era uma matéria de fundo a ser discutida a longo prazo, em praça pública e que presentemente há assuntos mais prementes para a sociedade portuguesa.

Pois é, há sempre assuntos mais prementes que a discussão dos direitos das minorias; ou não fosse a Democracia a Ditadura da Maioria.

Será que desde o 25 de Abril de 1974 (34 ANOS!!!) ainda não se encontrou o momento oportuno para debater a regulamentação duma evidência, que é as uniões conjugais entre pessoas do mesmo sexo?

Afinal a apregoada Liberdade de Abril não foi para todos?
Será que a Constituição da República Portuguesa não é para ser respeitada e cumprida em toda a totalidade do seu texto?

Que temem os deputados da Assembleia da Républica e políticos em geral, com a discussão dos direitos das minorias sexuais?
Recearão eles alguma indiscrita revelação sobre as suas vidas privadas?
Entre-pares, no nosso gueto-gay (a que a sociedade portuguesa preconceituosa e homófoba nos restringe, com uma desatenção hipócrita e mal disfarçada), constumamos gracejar que um gay fareja outro a milhas. Cá por mim, basta-me olhar para as caras e olhos de alguns dos políticos cá da praça para... cala-te boca, senão ainda te boicotam o blog e mandam a PJ te investigar.

A intervenção do senhor Manuel Alegre revela laivos dum saudoso revivalismo-marxista, dogmático e homofóbico. Esta sua atitude reaccionária pôs termo a alguma admiração que eu tinha pelo senhor; pois neste caso de direitos de ditas minorias (pois nada me convence que os homossexuais na sociedade portuguesa sejam uma minoria; será sim uma minoria o número daqueles que aceitam para si mesmos e assumem a sua identidade sexual) quem não está por mim está contra mim.

Logo só me resta dizer: Bye-bye, Manuel Alegre! Não contes mais com o meu voto!

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

VENDO TV: NOTÍCIAS?!


Vivemos numa moderna versão da viciosa sociedade romana, aquando da sua fase mais decadente. A nova versão das infames arenas romanas são os noticiários televisivos.

Dos poucos tipos de programas a que assisto na TV, os noticiários são um deles. Porque procuro manter-me minimamente informado sobre o que vai pelo mundo, tenho que levar em cima com todo o tipo de notícia panfletária sobre violência e mais violência; de todos os tipos e para todos os gostos Um grotesco desfile de horrores.

Mas será que não haverá BOAS NOTÍCIAS por esse mundo fora? Haver há!... mas não vendem!

«O que o pessoal gosta mesmo é de sangue» respondia-me outro dia um amigo meu. E concordo com ele. Infelizmente instalou-se a cultura do voyeurismo sanguinolento. Quanto mais chocante melhor! Quanto mais horroroso melhor! A exposição abusiva e repetitiva até à exaustão das maiores perversidades e atrocidades. Como se um visionamento não fosse suficiente para informar.

Já todos sabemos que a televisão é o veículo educativo/formativo por excelência no nosso tempo presente. Creio que deveria haver por parte de TODOS um cuidado maior na responsabilização dos critérios de escolha dos conteúdos da programação televisiva. Podem-se manter critérios de livre informação sem se cair no exagero do intrusivo e abusivo.

Dizia o povo: «Junta-te aos bons e serás como eles, junta-te aos maus e serás pior que eles.»

domingo, 31 de agosto de 2008

DOMINGO

Acordar tardio; já no início da tarde.

Habitual fastio de tudo; de comida, de tarefas, de entertenimentos, ..., de tudo.
O Sol alto e descoberto de Verão, era um ferrete impiedoso e torturante.

Primeiro o deambular pela casa, procurando nada. Depois o sentar na borda da cama, queixo apoiado nas palmas das mãos em concha e os cotovelos assentes no joelhos. O olhar fitando a parede vazia em frente.

O tempo continua no arrastar dos ponteiros dos relógios. A vida prossegue sem nossa intervenção. Sabemos que lá fora o mundo existe nos seus vários ritmos e funções. A minha função; a de me manter vivo.

Ligo o macbook e dedico-me a organizar ficheiros de música. Os meus queridos ficheiros musicais. O oxigénio que me mantém vivo e desperto; o sangue arterial que me dá ânimo para continuar. O Manto de Arminho, que me resguarda da vida gélida minha madrasta.

Um convite arreda-me do meu refúgio: vamos ao supermercado! Depois do sol escaldante da tarde estival, está frio lá dentro. Andamos para trás e diante, entre filas de expositores de mercearias. Os olhares alheios atingem-me; encolho-me atrás dos meus óculos escuros. Impaciento-me por sair dali.

De regresso ao lar, o arrumar das compras e o preparar lesto para uma surtida ao cinema.

No automóvel encolho-me no assento traseiro, escudado pelos meus óculos escuros e os auscultadores onde se desfiam as notas do meu encantamento. A paisagem desfila lá fora, espiada através dos vidros; aglomerados urbanos, seguidos de aglomerados urbanos, alguns intervalados de baldios.
Tentamos entrever entre os transeuntos algum exemplar que nos dê alguma sensação de deleite fugaz. O mesmo se repetindo no centro comercial, o destino da nossa curta viagem.

O comprar os bilhetes para a sessão de cinema, antes que esgote. O deambular pelos corredores amplos, ladeados de lojas. O entrar numa ou outra para apreciar alguns artigos de interesse, ou mesmo até para comprar.

Hora de jantar. A escolha do restaurante; fast food. Abstenho-me de fazer sugestões e aceito a decisão alheia. É-me indiferente o tipo de comida; serve apenas para nutrir o corpo e mantê-lo vivo.

À saída do filme encontro um velho amigo-colega de escola. Conversa de circunstância e uma tentativa de evitar alongar-me em detalhes sobre a minha presente inexistência. Curto o encontro, rápidas as despedidas. A caminho do automóvel para regressarmos a casa, sou assolado pela inevitável avalanche de memórias duma juventude já muito longínqua no tempo.

Ao sair do imenso edifício... o doce encontro com o negro ar da noite. Cúmplice tranquilidade.

Regressados a casa, pude então retirar os resguardos e baixar a guarda.
O ataque foi fulminante! Verguei-me sob o peso devastador de mais uma crise de ansiedade. Prostrado, fustigado por tremores convulsivos, chorei. Porquê? Não tem resposta.

Minutos depois, cansado, procurava recuperar uma normalidade exterior, suficientemente tranquilizadora para os que partilham do meu quotidiano.

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

VENDO TV: GEO-ESTRATÉGIAS

Ouvi ontem a actriz e ex-deputada, Odete Santos, afirmar que «os ocidentais não entendem o pensamento dos orientais nem os orientais entendem o pensamento dos ocidentais». Concordo.
O pensamento tem a ver com o sentir, a cultura, a história, o ambiente, as condições de existência e vida, com as expectativas e aspirações, e muito mais ainda. E tudo isso é o bastante para gorar à partida qualquer tentativa de globalização hegemónica. Tem até contribuido para muito conflito social e político. Cada um se acha senhor da razão e da verdade absoluta, tentando impô-las aos outros.
Bom-senso é o que tem faltado nas investidas políticas entre ocidente e oriente.

De novo assistimos a uma escalada de ameaças e afrontamentos entre o ocidente Euro-Washingtoniano e a Rússia. E tudo por causa dum títere de aspirações ditatoriais que governa a Geórgia, acoitado, tal como outros antes dele o foram em outras partes do globo, por Washington e seus lacaios.
E isto remete-nos a uma reflexão sobre o papel da NATO (ou OTAN). Ora a NATO foi criada num clima de guerra-fria entre os aliados Europa-USA contra o Bloco liderado pelos Soviéticos. Ora com o fim do regime soviético e o desmembramento do Bloco de Leste, o passo mais óbvio seria a dissolução da NATO, para que se desse início a uma nova fase de diálogos e procura de entendimentos conducentes a diplomacias tendentes a uma aproximação de interesses e intercâmbios pacificadores.

A Europa devia se organizar numa política geo-estratégica própria e deixar de acolitar os desvarios imperialistas de Washington. Enquanto ela permanecer algemada aos USA, os seus possíveis aliados historicamente naturais, sempre terão suspeitas a respeito da sua imparcialidade.

Os primeiros motivadores da crise georgiana são os USA, acolitados pela Europa, com o seu cerco estrangulador de instalações bélicas junto às fronteiras da Rússia. Ora cão acossado não fica manso. Que esperavam que a Rússia fizesse, perante a tentativa de lhe retirarem as zonas tampão de segurança a Sul, quando já antes se haviam apropriado das mesmas a Oeste?

terça-feira, 19 de agosto de 2008

...OF OUR LIVES

Hoje não quero dizer nada, não quero comentar nada, não quero pensar em nada.
Hoje quero apenas ficar ouvindo música. As minhas amadas músicas, que tanta mágoa tenho de não as poder levar comigo quando atravessar para A Outra Margem. Sei que O Barqueiro me dirá que terei de as deixar ficar para trás, como tudo o resto.
Mas tudo o resto até é mais facilmente dispensável. Contudo as minhas músicas... essas será bem mais difícil. Elas sempre me acompanharam e continuarão acompanhando.
Ajudam a suportar o fardo. Tenho sempre uma para cada momento. Há sempre uma música que serve de fundo sonoro para um determinado estado emocional. Há sempre uma melodia que me ajudava a reencontrar o meu rumo.
Eu sou um poeta. Mas se o sou é apenas porque a música vive em mim. A poesia não é mais que a música das palavras.
O título para este texto é uma citação do verso final de «Take a Peble», dos Emerson, Lake & Palmer; estava ouvindo quando quis dar o título ao post.

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

VENDO TV: DESLEIXOS OLÍMPICOS


Tem-se assistido a péssimas prestações dos ateletas portugueses no decorrer destas olimpíadas, muitos deles e delas com resultados muito inferiores aos seus próprios mínimos de apuramento para integração da representação portuguesa. E, de modo geral, o motivo por trás de tais desastrosas presenças em arena tem um mesmo fundamento; iníbição perante as multidões assistentes.

Eu até entendo os atletas (como justificarei adiante), embora não os desresponsabilize da falta de brio e bom-senso com as afirmações tolas (no mínimo) aos orgãos da imprensa. Cúmulo dessas afirmações foi a daquele jovem anafadinho que se queixava do seu infortúnio por terem marcado a prova dele para de manhã, altura em que ele «costuma estar na caminha» (afirmação sua).
O quê??? Mas atleta olímpico dorme toda manhã na cama? Não é suposto atleta olímpico ter uma agenda de trabalhos de treinamento para o manter em forma sempre que dele se exija o seu melhor desempenho? Aí a responsabilidade não é apenas do atleta, mas do seu supervisor técnico principalmente.

Mas voltemos às multidões. Na verdade o estádio olímpico «Ninho de Pássaro» é algo de grandioso e que, devido à sua arquitectura muito própria, cria um grande elo anímico entre público e atletas (e isso é deveras avassalador). Até sobre esse aspecto o estádio é uma obra-prima da arquitectura actual.
É natural que atletas habituados a prestarem provas perante estádios vazios de público (não contando como é óbvio com os familiares e as equipas técnicas de apoio), como são os portugueses em eventos de atletismo, sintam alguma inibição perante o gigantismo dum público olímpico.
Contudo a mim parece-me que essa falha tem raiz numa deficiência mais profunda e, começa muito mais cedo.

Desde pequenos não somos habituados a enfrentar o público. Nas escolas (instituição por excelência para a integração do indivíduo com o meio social) não são incentivadas palestras individuais em que os oradores (cada aluno por sua vez), defendesse uma intervenção oral, de temática à sua escolha, perante a restante turma. Palestras essas que depois deveriam ser transferidas progressivamente para plateias mais amplas, como as dos anfiteatros escolares onde se reuniriam todas as turmas do mesmo ano e, mais tarde ainda, todos os alunos da escola.
Isso não apenas serviria para o jovem ir ganhando auto-confiança e desinibição, como também o prepararia melhor para PENSAR e defender as suas ideias.

Não adianto mais o tema. Embora houvesse muito mais a dizer. Deixo apenas estas conjecturas à vossa consideração e reflexão.

domingo, 17 de agosto de 2008

VENDO TV: ARMAS NAS ESCOLAS


Num distrito do Texas (Harold, suponho), nos USA, as autoridades municipais aprovaram regulamentação que autoriza os professores e funcionários das escolas a levarem armas de fogo para as mesmas. A medida visa a protecção dos mesmos, perante os contínuos ataques armados que têm sido perpetrados nas escolas americanas.
Pois é! É assim mesmo como vocês leram... Ah! E tem mais! Os pais dos alunos aplaudiram a ideia. Ãh?!...

Fico sem saber por onde hei-de começar. Mas talvez nem valha a pena o esforço de argumentar tentando demonstrar a estupida monstruosidade da medida. Os factos falam por si mesmos.

Eu, na minha infância não gostava da escola e temia os professores. Se soubesse que os meus professores me davam aulas armados de pistola, acho que a minha mãe teria de me mandar para a escola de fralda.

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

FISGA


Eu sofro de Sindroma de Pânico, presentemente (já à um longo presente) associado a uma Depressão Distímica.


Logo me perguntam o que é isso de Distimia?
É uma forma de depressão prolongada que apresenta sintomas de certo modo semelhantes à Doença Bipolar.
E isso traduz-se em quê? Perguntarão. Ora aí vamos...


Roller Coaster!!!
Yuuupiiiiiiiiiiii!!!......... AAAAAAAAAAAAAHHHHHHHH!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!.....................
Uma montanha-russa!


É sentirmo-nos como se fossemos uma fisga psicológica, com reflexos físicos. Somos esticados até ao ponto de pré-ruptura, para depois sermos largados. E disparado o projéctil, pendemos banboleando lassos e imprestáveis. Até ao próximo arremesso.


Continuadamente vivemos na ignorância de quando será a próxima crise, pois elas podem ser desplotadas sem motivo aparente. Um momento estamos calmos e tranquilos e no seguinte, sem que nada em redor se tivesse alterado, podemos estar completamente eufóricos, rindo tolamente perante a estupefacção de quem nos rodeia na ocasião. Ou então podemos ficar no maior desalento, com uma tristeza profunda motivada por nada.


Então a vida começa a tornar-se um fardo imensamente pesado. Um medo imenso do momento seguinte, por não sabermos como iremos estar nesse momento seguinte. Por não encontrarmos razão para continuar vivendo, para continuar esperando que alguma vez consigamos a tranquilidade que proporcione alguma felicidade.


E, então aí, sentimos uma sombra rondando perto. Dissimulada. Escondida. Mas suficientemente próxima para sentirmos o seu bafo nos roçando a espinha e os seus véus negros nos toldando a razão. E a sombra toma forma. E a forma toma um propósito. E o propósito é morrer. Acabar com esta Pedra de Sisifo. Finalmente descansar...


Hoje falei de mim.


Perdoem-me o egoísmo do desabafo.


Contudo eu não sou o único a viver este drama. Somos milhares. Muitos de nós vivemos ao teu lado e tu ao olhar nem te apercebes que por dentro vivemos assim.

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

ENTERRANDO DINHEIRO

Mais uma estúpida medida faustosamente anunciada por este patético governo de Portugal.
58 milhões de euros (custo previsto na apresentação pública da obra; pois no final acabam sempre por se acumularem as derrapagens financeiras) para a construção de 220 metros de metro (sim, aquele tremzinho que corre debaixo de terra que nem minhoca) em Lisboa. Chamo a isto enterrar dinheiro!

Há que melhorar o serviço de transportes colectivos da capital portuguesa, concordo e apregoo veementemente. Mas o metro de Lisboa (embora seja eu um cliente assíduo e a que dou preferência) é a solução mais estúpida para os problemas de mobilidade da cidade. É debochadamente caro e não resolve o principal problema: o excesso de viaturas, circulando pelas congestionadas artérias de uma cidade velha, que tenta a todo custo, com alguns remendos de cosmética pacóvia, modernizar-se.

Numa cidade com a topografia de Lisboa, com a sua distribuição demográfica e organização (maldosamente diria desorganização) urbana, com o seu valioso património monumental (tão ultrajantemente votado ao abandono), com o singular e irregular traçado das suas ruas e avenidas (em muitas zonas com um pitoresco tão peculiar e turisticamente apelativo), a preferência deveria ir sempre para o metro de superfície. E isso por inúmeras vantagens, das quais apenas aludirei algumas:
- Seria imensamente mais barato.
- Ao ser mais barato possibilitaria o investimento numa rede muito maior e logo geograficamente mais abrangente.
- Forçaria a uma rigorosa disciplina da circulação rodoviária. Ajudando à eliminação da anarquia de estacionamentos irregulares e trânsito caótico.
- Teria a possibilidade de alcançar as zonas das colinas históricas (fora do alcance do metro subterrâneo) servindo assim tanto as populações locais como o acesso fácil ao turismo. Induzindo uma posterior revitalização e desenvolvimento dessas que deveriam ser as zonas historicamente nobres da cidade.
- Reduziria o recurso ao transporte colectivo rodoviário urbano, ajudando assim a uma substancial redução de emissões de gases poluentes.
- Permitiria uma acessibilidade mais fácil a utentes com variados tipos de incapacidades

E por aqui me fico. Se as entidades interessadas quiserem saber mais, eu estou disponível a discutir montantes de subvenção por acessoria.

LUSITANA JUSTITIA

Um indivíduo a cumprir pena de prisão evade-se da cadeia, conseguindo manter-se a monte por vários anos.
Recentemente esse indivíduo faz-se acompanhar do filho, menor de 12 anos (ou 11 ou 13 pouco importa) e de mais um cunhado, para entrarem em propriedade alheia vedada, afim de furtarem material de construção civil.
Denunciados na hora por uma testemunha, são apanhados em flagrante pela guarda. Ao encetarem a fuga, no veículo em que se haviam deslocado, tentam atropelar um dos agentes da autoridade que lhes dava ordem de paragem.
A patrulha da guarda enceta perseguição ao veículo em fuga, que desobedecia às indicações de paragem. Um dos agentes policiais dispara sobre o veículo dos assaltantes, tentando acertar nos pneus para o imobilizar. Após vários disparos logram os perseguidores deter os fugitivos.
Detidos os adultos constactou-se que o menor havia sido atingido pelos disparos, vindo a falecer mais tarde no hospital.
Presentes a tribunal de instrução criminal os assaltantes são postos em liberdade, sob termo de apresentação periódica às autoridades.
Depois da libertação o tribunal acaba por constactar que o pai da criança apresentara para ser identificado um bilhete de identidade falseado (colocara a foto dele no B. I. dum irmão) e que afinal era procurado pelas autoridades por evasão da cadeia. Obviamente que quando o procuraram já ninguém o encontrou.
O agente da guarda, autor dos disparos, está detido acusado da morte do menor. A Lei portuguesa impede os agentes da autoridade de utilizar disparos de armas de fogo em caso de perseguição automóvel.

Abstendo-me de fazer quaisquer outras considerações ou pôr outras questões, apenas pergunto: como pode um Juiz, pôr em liberdade um pai que se faz acompanhar dum filho menor para um assalto de onde este acaba por sair cadáver?