Nêgão não. Pretão mesmo!
É todos os meses a mesma
vergonha! No dia dos idosos e incapacitados receberem as suas pensões do INSS
no Itaú, uma das duas sucursais dessa instituição bancária situadas no Largo da
Paz (Afogados, Recife-PE) está sempre com o sistema informático em baixo e de
portas fechadas. Coincidência assaz estranha.
Ora, tal infortúnio leva a que
toda essa gente, com dificuldades e incapacidades, se tenha de deslocar para a
sucursal vizinha. Aí, perante o acumular de gente de dois balcões em apenas um,
gera-se a maior confusão e desnorteamento.
Colho informações aqui e ali e
finalmente tomo o meu lugar no termo duma fila imensa. O local estava repleto.
Uma muvuca heterogénea e incaracterística, onde predominava o mau gosto e a
decadência, tentando esconder a miséria material de quem não nasceu com direito
a sombra. Senão àquela com que os mais ricos exploram os mais desvalidos.
O meu olhar vaga por sobre as cabeças
velhas e irrequietas. Lá à frente, acima do mundim, destaca-se um jovem alto e
forte. Delicioso tom de chocolate negro, de carnes cheias – sem ser gordo, nem
nenhuma daquelas aberrações hiper-musculadas, entufadas de esteróides
anabolizantes. A tez negra coruscava e brilhava acima da populaça perfilada e
amontoada. Alto e distinto, com um porte nobre, mas humilde, era um farol, um
magneto atraindo o meu olhar, sempre ávido de beleza. O negro dos ombros musculosos,
espreitando além das alças da camiseta, destacava-se da massa informe de
cabeças nervosas. Com calma e suavidade amparava a mãe que mostrava dificuldade
de locomoção. Paciência de filho amoroso denunciada pelo sorriso feliz e
orgulhoso da senhora. Bem ela se podia orgulhar, não só da beleza que pariu,
mas do excelente carácter humano que o sereno e carinhoso olhar dele
denunciava.
Foto da trilha bloqueada, feita por mim no banco.
Contudo algo anacrónico me distraía da beleza núbia do mais olímpico ébano. Como manda a lei e a solidariedade cívica, desde a porta de entrada estendia-se pelo chão e até um dos balcões de atendimento, o trilho táctil destinado aos cegos (que é assim o nome que me ensinaram em criança, sobre as pessoas com incapacidade visual e que nunca achei que fosse desrespeitoso). Só que chocado notei que sobre esse trilho tinham colocado cadeiras. Além de que, devido à má organização e gestão dos espaços, a fila de outro balcão se estendia igualmente sobre ela, quando deveria estar livre em toda a sua extensão. Eu mesmo, me via obrigado a permanecer sobre a trilha, para respeitar a minha vez.
Se as pensões que as pessoas
recebem não fossem miseráveis, elas não teriam de correr logo pela manhã do dia
de pagamento, para a boca do caixa. Se auferissem o bastante para viverem
dignamente e com tranquilidade poderiam ir a qualquer hora e em qualquer dia
fazer os seus resgates com dignidade. A dignidade que todo o ser humano merece.
Tanto a pessoa a quem eu estava prestando uma ajuda, como a mãe do belo mancebo
e ele próprio em todo o seu esplendor de beleza e juventude. Todos ali éramos
seres humanos tratados como mercadoria, útil apenas para o enriquecimento dos banqueiros
e accionistas bancários.
3 comentários:
De volta depois de alguns dias de passeio ...
E assim seguimos nossa sina de rebanho mal cuidado ... o q fazer?
e assim caminha a humanidade...
Muito me entristece saber que o Brasil, cuja presidente quer ostentar nobreza, acenando para a plebe das tribunas da abertura das olimpíadas, não consegue resolver simples problemas de civilidade e cidadania! Um país que não consegue organizar uma fila decente e nem dar tratamento digno aos seus cidadãos mais humildes, querendo se fazer presente no jet set internacional! Muito triste isso meu amigo! Abraço com amizade!
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